segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Carta aberta - parte 01







(Para Miss Colotto )


"Diante de você me coloco
como numa súplica, num berro mudo,
na beira da cama, joelhos em carne viva,
para que segure minha mão bem forte
por onde tenho receio de caminhar só
nem que seja agora, por um segundo,
para depois nunca mais...

(...)

Você sabe, é escuro,
nenhum vento vibrante,
todos querem a mim
desconhecem o escrúpulo,
mesmo a minha pessoa,
e banalizam minha existência
por motivos torpes
como se me jogar ás feras
servisse de alento
ao sentir meu adormecer sob a tempestade.
Alcançam o cume da montanha mais impiedosa
sem petrificar os dedos com gelo
nem o peito pressiona
fincando a aventura na flâmula,
mastro dilacerando a carne
e tudo aquilo pelo qual um dia concentrei minhas forças.

Liberto-me agora, voluntariamente,
aplaudindo ironicamente enternecida
pelo bem que a mim tem feito
perante cada amanhecer... "

O souvenir





Quando desapercebida do mundo,  por vezes me indagam:
"Garota, por quê não escreve mais? Nem parece que tem uma página para isso!"
E nisso reflito, porém não tinha a resposta certa.
Até agora.

Hoje sei que, ao triscar de cada tecla, muito vai de mim,
mais até do que podia, bem além do que preciso aliás.

É o que se esconde no desvendar do texto, mesmo num medíocre feito o meu,
como se um bocado de quem está aqui, prostada á frente da máquina velha,
se esparramasse como plumas de um travesseiro jogadas do topo de um prédio.
Não dá para juntá-las depois, elas simplesmente fogem
como os parcos momentos de coragem que utilizo para expor
aquilo que naturalmente as pessoas escancaram sem sentido.

Quem diria, um guardanapo de bar fez o trabalho por mim:
rendeu literatura...

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Alma de velha moça




As lentes sujas do velho óculos
empoeirados pelas letras fugazes, 
nitidamente despejadas num livro de histórias e procedência duvidosas,
escancaram aquilo que o meu escárnio não quer aceitar.

E no emaranhado dos versos dispostos
na folha amarelada
o indizível se esconde
como criança brincando de pique-esconde
por trás da cortina transparente
ao lado da poltrona furada.

Contudo,
como que sob o efeito de uma droga
devoro o delinear
que um estusiasta lauretano escolheu
para materializar o seu sonho.
E descubro,
aterrorizada,
que a mesma insignificância
usada quando da composição deste devaneio
morre na ponta do lápis que atravessa o papel
pelo supervisão do olhar derradeiro,
seu único companheiro
na marcha final.
Até virar um amontoado de sujeira,

poeira poética,

manchado pela mesma cortina imaginária do meu caro amigo e falso poeta...

domingo, 5 de setembro de 2010

"Dogma"






"Quando o apito da fábrica de tecidos
Vem ferir os meus ouvidos
Eu me lembro de você
Mas você anda
Sem dúvida bem zangada
Ou está interessada
Em fingir que não me vê
Você que atende ao apito de uma chaminé de barro
Porque não atende ao grito
Tão aflito
Da buzina do meu carro
Você no inverno
Sem meias vai pro trabalho
Não faz fé no agasalho
Nem no frio você crê
Mas você é mesmo artigo que não se imita
Quando a fábrica apita
Faz reclame de você
Nos meus olhos você lê
Que eu sofro cruelmente
Com ciúmes do gerente
Impertinente
Que dá ordens a você
Sou do sereno poeta muito soturno
Vou virar guarda-noturno
E você sabe porque
Mas você não sabe
Que enquanto você faz pano
Faço junto ao piano
Estes versos pra você..."